sábado, 1 de novembro de 2008

No princípio era o Verbo! O verbo caro!


Caro Filoteu

Resolvi partilhar contigo umas considerações, muito simples, em forma de uma conversa com a Palavra eterna do Pai. Tu verás que, ao expor tais escritos, meu objetivo é ampliar esta contemplação a fim que contemples comigo e com Ele converses, fazendo-me companhia. Eu converso com Ele como Verbo caro que significa Palavra querida, ou seja, Palavra a quem me afeiçoei, por quem nutro estima. Queira o Pai que nossa amizade pela Palavra seja assim e cresça sem medidas. Um outro conceito de caro, vem do Latim. Caro quer dizer carne. Isso mesmo, a Palavra se fez carne. Peço que mergulhes comigo neste meu diálogo com o Verbo caro.


Aquele que no princípio era o Verbo (cfr. 1Jo 1,1), isto é, antes de todas as coisas, antes de tudo e de todos, na eternidade sublime e plena da adorável Trindade, Ele, Deus com o Pai, Ele consubstancial com o Altíssimo, eis que o contemplamos nos esplendores do seio paterno, gerado eternamente, segunda Pessoa da comunidade Trinitária. Vinde adoremos!

Eu me inclino ante a Ti, Verbo que és Palavra, isto é ação, força operativa, transformadora. Mas, Tu, ó Sabedoria eterna, não és uma mera idéia ou uma energia, nem um ilustre personagem que entrou na história. És Pessoa, um alguém real e verdadeiro. És Deus e És homem.

Falei que te contemplo. Quem vejo? Aquele que Deus revela ou quem meu egoísmo ou minha fantasia idealizante quer ver? Quem contemplo? Que sei de Ti? afinal, quem És?

Sigo com humildade os passos e orientações do teu apóstolo: "Ninguém jamais contemplou a Deus" (1Jo 4, 12). E por que? João denuncia os "espirituais" que se gabavam de conhecer a Deus por intuição direta. Além disso, o prólogo do evangelho joanino nos afirma peremptoriamente: "Ninguém jamais viu a Deus: o Filho único, que está voltado para o seio do Pai, este o deu a conhecer" (1Jo 1, 18). E ainda, nas palavras que brotaram de tua própria boca, Tu que és a Palavra: "Também o Pai que me enviou dá testemunho de mim. Jamais ouvistes a sua voz, nem contemplastes a sua face" (Jo 5, 37). Ó meu bom e misericordioso Redentor, eu te rogo por teus infinitos méritos: Leva-nos a todos a compreender e acolher a grande verdade de que a comunhão e a visão estão unidas! Não nos é possível ver-Te se não estamos em unidade, pelo Teu Espírito, contigo e com o Pai que te enviou a nós! Ele que é Teu e nosso Pai. Tal unidade contigo significa necessariamente comunhão com os pastores que legitimamente colocaste à frente de tua Igreja e todos quantos, apesar de suas fraquezas humanas, devem nos conduzir, são mediadores de tua vontade, exceto se estiverem afastando-nos de teus mandamentos ou da verdade ensinada oficialmente por tua Igreja. Estar em comunhão contigo significa viver em fraternidade, reconciliar-se, amar na gratuidade. Em suma, ver-Te está longe da presunção de ver tudo quanto a humana vaidade me faz ver sobre Deus ou sobre o Reino presente em Tua Igreja. Não por nada, os dois discípulos de Emaús (cf. Lc 24, 30-35) ao contemplarem a Ti, ó sol divino ressuscitado, ao verem aquele pão partido por tuas mãos santas e veneráveis, de repente, diante deles desapareceste. E logo no melhor da festa! Que fizeste, meu Senhor? Não querias fartar aqueles olhos dos discípulos com o esplendor de Tua glória? Sim, entendo bem. Desapareceste de sua vista exatamente para que te encontrassem na comunidade, junto com os demais. E para tanto, o medo da escuridão, a apreensão do dia a declinar deixou de ser um problema. O medo desapareceu pois as verdadeiras trevas que eram as dúvidas, a incredulidade, uma leitura superficial dos acontecimento, tanta escuridão foi eclipsada pela tua luz cheia de fulgor, ó divino ressuscitado.

Para nós outros, que acreditamos no testemunho dos apóstolos, nós que deles recebemos a fé, trilhamos o caminho seguro. E qual é esse caminho seguro, senão caminhar na comunhão, iluminados pela bruxuleante luz da lamparina da fé, alimentada pelo combustível da caridade? Que engano perigoso é este de amparar-se nas certezas pessoais de visões "luminosas" sem este imprescindível aval de uma comunidade regida pela autoridade apostólica! Tal autoridade tem o selo de tuas palavras: "tudo quanto ligardes na terra será ligado no céu e tudo quanto desligardes na terra será desligado no céu" (Mt 18,18). Como se não fosse o bastante, prometeste tua inefável presença onde dois ou mais estiverem reunidos em Teu nome (cf. Mt 18, 20).

Verbo caro, és Palavra-ação. Então, tudo recebeu vida, existência por meio de Ti. És a vida (cf. Jo 14, 6) que me arrancas da morte. E por seres vida, és luz (cf. 1Jo 1, 4); com efeito, Tu te auto-proclamaste a luz do mundo e quem te segue não andará nas trevas, mas terá a luz da vida (cf. Jo 8, 12). Seguir-Te significa dissipar as trevas que continuamente brotam em nós. Como João, o enviado de Deus, somos testemunhas da luz (e tomará que o sejamos de fato!). Mas, eu sou trevas, como poderia ser testemunha da luz?

Ó Verbo caro, Tu és a verdadeira luz que iluminas todo homem. Basta deixar-me iluminar por Ti e cumprirei minha missão de ser testemunha da luz. Por isso, faço-Te esta pergunta: Que significa deixar-se iluminar por esta luz? Enquanto me pergunto, recordo-me de uma musiquinha que marcou meu passado:

"Minha luz é Jesus, e Jesus me conduz, pelos caminhos da paz"

E ainda,

"Deixa a luz do céu entrar, deixa a luz do céu entrar, abre bem as portas do teu coração e deixa a luz do céu entrar".

E ainda mais um música que nem da Igreja era, mas carrega consigo uma capacidade forte de evocar este convite a acolher a luz:

"Abre a porta e a janela e vem ver o sol nascer".

Deixar-se iluminar é expor-se a Ti, Jesus, sol divino e, com os raios de Tua beleza, de Tua verdade e de Tua bondade colher as graças com que nos prodigalizas.

Deixar-se iluminar efetiva e afetivamente, progredir em docilidade, abertura é deixar-se trabalhar, podar, plasmar, moldar, receber os acabamentos de tuas habilidosas mãos de artesão da mais refinada perfeição. Deixar-se iluminar é dispor-se a elotrocultar-se com aquelas descargas elétricas fulminantes de tua ressurreição. Fulminantes, entenda-se, par tudo quanto está morto em nós, em função do obscurantismo do pecado. Ou seja, exatamente aquilo que em tua Palavra o discípulo amado descreve como "o mundo não o reconheceu" (cf. 1Jo 1, 10). Ou de maneira mais contundente, "Veio para o que era seu e os seus não o receberam" (cf. 1Jo 1, 11).

Deixo aqui ó caro Senhor, meu pedido para sempre te recebamos. Eu e teus filoteus queremos viver a experiência de sermos tuas Betânias, tuas moradas, teu lugar de repouso. Nossa amizade, é Verbo caro se traduza não em meros sentimentos, mas em vida comprometida, acolhida e ofertada.

A ti, Filoteu deixo este diálogo para que nele mergulhes e neles te percas e te encontres com aquela simplicidade e profundidade que os verdadeiros adoradores em espírito e verdade ousam viver.

Voltaremos a dialogar com o Verbo caro!

Abraço e bênção, deste filoteu, Pe. Marcos.